quarta-feira, agosto 23, 2006

Sinestesia

Tirem-me a vista.
Tirem-me para sempre a luz de Lisboa,

Tirem-me as encostas do Douro, o Tejo e o Alentejo,
Tirem-me a calçada dos passeios e os azulejos da parede.

Tirem-me o ouvido.
Tirem-me para sempre o choro da guitarra

e o pranto do fadista,
Tirem-me os pregões das mulheres do bulhão

e a pronúncia de norte a sul,
Tirem-me a fúria de espuma das ondas e o grito do golo.

Tirem-me o tacto.
Tirem-me para sempre o sol de Inverno a bater na cara,

Tirem-me o barro a ganhar forma entre os dedos,
Tirem-me o rosto queimado da minha mãe

e a mão áspera do meu pai.

Tirem-me tudo isto, mas não me tirem o gosto.
Porque se eu ainda for capaz de saborear

a alheira a rebentar de sabor,
ou o bacalhau com todos a nadar em azeite,

Serei capaz de dizer,

se não me tirarem a fala,
que estou em PORTUGAL.


(O anúncio de Televisão que não me canso de ver, ouvir e sentir vezes sem conta)

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